INTRODUÇÃO
No adulto, a maioria das fistulas entre o esófago e estruturas pulmonares é adquirida e surge em contexto neoplásico. É uma complicação rara, ocorrendo em <15% doentes com neoplasia esofágica e 1% doentes com carcinoma broncogénico. A sintomatologia pode surgir de forma abrupta ou indolente, dependendo da localização e tamanho da fístula (mais repentino e precoce quanto maior e mais proximal).
CASO CLÍNICO
Homem de 56 anos recorreu ao Serviço de Urgência por quadro de dispneia com um dia de evolução; sem agravamento do padrão habitual de tosse e expetoração, sem febre ou outras queixas.
Encontrava-se em tratamento de neoplasias síncronas – carcinoma epidermóide da hipofaringe e carcinoma epidermóide do esófago, apresentando caquexia marcada e disfagia global, com necessidade de colocação de PEG que não utilizava por preferir a via oral. Estava a realizar radioterapia radical dirigida ao esófago; não candidato a esquemas adicionais de quimioterapia. TC torácico (mês anterior): espessamento parietal concêntrico do esófago torácico; extensão longitudinal 6.2cm e espessura parietal 1.6cm - processo neoformativo primário de carácter estenosante.
Exame físico: normotenso (138/82mmHg), normocárdico (80bpm) e apirético; polipneico, com saturação periférica 74%. Auscultação cardíaca sem alterações; auscultação pulmonar com hipofonese marcada no hemicampo superior direito e crepitações inspiratórias na metade inferior. Gasimetria de sangue arterial a confirmar hipoxemia grave (pO2 41.3). Analiticamente: hemoglobina 9g/dL e elevação de PCR (219.5mg/L), sem leucocitose. Radiografia de tórax: infiltrados algodonosos dispersos no hemitórax direito, com imagem sugestiva de cavitação no lobo superior (imagem 1).
Por imagem pulmonar sugestiva de tuberculose em doente imunodeprimido e com caquexia marcada, colheu expetoração para micobacteriológico e fez TC de tórax (imagem 2) – pulmão direito: extensa cavitação no lobo superior e múltiplas consolidações nodulariformes dispersas de conotação infeciosa; solução de continuidade esófago-pulmonar no terço médio do esófago, sugestiva de processo erosivo em contexto de neoformação.
Doente discutido em equipa multidisciplinar, que considerou não haver reserva fisiológica para medidas invasivas. Foi colhido rastreio séptico e instituída terapêutica empírica com piperacilina/tazobactam e oxigenoterapia com máscara de alto débito. O doente faleceu ao 3º dia de internamento por insuficiência respiratória secundária a pneumonia necrotizante direita.
DISCUSSÃO
Apesar de raras, as soluções patológicas de continuidade entre o esófago e estruturas pulmonares apresentam morbimortalidade significativa. Pela sua raridade e inespecificidade dos sintomas, o diagnóstico é frequentemente tardio.
O encerramento espontâneo destas lesões é raro e sem tratamento o prognóstico é mau e a sobrevida curta. A abordagem deve ser multidisciplinar, embora nos casos de neoplasia a intervenção tenha intuito maioritariamente paliativo.