Martim Alçada, Sofia Mendes, Guilherme Cunha, Marina Boticário, Maria Filomena Roque
Introdução: O SRI trata-se de um conjunto de distúrbios inflamatórios associados ao agravamento paradoxal de processos infeciosos preexistentes após o início da TARV, deve-se à melhoria repentina da função imunitária após o início da terapêutica, é geralmente autolimitado embora raramente possam ocorrer desfechos fatais, particularmente quando estão envolvidas estruturas neurológicas. O risco de SRI está associado à severidade da imunossupressão, sendo mais elevado em doentes com contagem de CD4<50 e Carga viral >100,000 copias/ml.
Caso clínico: Doente do sexo masculino de 49 anos, internado para esclarecimento de quadro de febre com pico máximo de 40ºC sem preferência horária, que cedia apenas parcialmente a antipiréticos, tosse seca e diarreia aquosa com 3 episódios diários. Dos antecedentes pessoais a destacar: infeção por VIH1 conhecida há um ano, avaliado na consulta de infeciologia 11 dias antes do internamento apresentando CD4+ de 15, carga viral de 66400 log5.82 tendo iniciado TARV e profilaxias das infeções oportunistas. Do exame objetivo a destacar, emagrecido, desidratado com lesões orofaringe sugestiva de candidíase oral. Dos exames realizados salienta-se bicitopenia (Hg 8,7gr/dL; Leucocitos1400) e carga viral de Citomegalovirus (CMV) no sangue periférico de 28299 cópias. TC abdominal “...hepatoesplenomegalia com discretas lâminas de ascite…”. Assumiu-se doença disseminada a CMV com colite e Candidíase orofaríngea pelo que se iniciou terapêutica com Ganciclovir e Fluconazol mantendo TARV.
Embora os episódios de diarreia e odinofagia tenham resolvido o doente manteve-se febril, com progressiva distensão abdominal e agravamento objetivável clinicamente da hepatoesplenomegalia. Analiticamente verificou-se uma abrupta reconstituição imunológica com aumento da contagem de CD4+ 170 e diminuição da carga viral para 652 log1.7. Este agravamento foi atribuído a um SRI precipitado pela infeção a CMV, tendo sido iniciada corticoterapia sistémica.
Como apesar da corticoterapia sistémica verificou-se agravamento clínico, foram estudadas outras possíveis etiologias infeciosas para a precipitação do SRI. Após realização de mielograma foi diagnosticada em exame direto Leishmaniose visceral. Iniciou Anfotericina B lipídica verificando-se uma boa evolução clínica doravante, tendo sido dada a alta clínica para a consulta de doenças infeciosas.
Conclusão: O SRI é uma entidade pouco comum que pode ter consequências graves para o doente, pelo que é importante não só a identificação do agente infecioso precipitante e seu tratamento mas também o controlo da reação inflamatória inerente a esta síndrome com corticoterapia se necessário. Atendendo ao grau de compromisso imunológico destes doentes não se pode excluir a possibilidade de existirem múltiplos agentes infeciosos simultaneamente, como no caso apresentado.