Francisco Pombo, Marina Mendes, Pedro Lopes, Mari Mesquita
Introdução: A doença de Lyme é uma doença transmitida pela carraça, causada por espécies da espiroqueta Borrelia, podendo ter manifestações multissistémicas.
Caso Clínico: Homem de 90 anos, com antecedentes patológicos de silicose e doença cerebrovascular, dependência ligeira nas atividades de vida diária, recorreu ao serviço de urgência por febre, queixas de tonturas / desequilíbrio e artralgias de ritmo misto dos dedos de ambas as mãos. O doente não apresentava história de viagens recentes, contacto com indivíduos doentes ou com animais, embora com presença de cão no domicílio. Sem alterações particulares ao exame objetivo, nomeadamente artrite ou défices neurológicos focais / sinais meníngeos. Do estudo efetuado salienta-se elevação marcada dos parâmetros inflamatórios, radiografia torácica e exame sumário de urina sem alterações; realizada punção lombar com líquido cefalorraquidiano claro e sem alterações do estudo citobioquímico. Efetuado TC crânio-encefálico que não demonstrou alterações de relevo, tendo sido internado no serviço de Medicina Interna.
No internamento manteve febre e artralgias de ritmo misto, com discreto edema associado. Do estudo realizado destaca-se: eletroforese de proteínas séricas, imunoglobulinas, anticorpos anti-dsDNA, anti-ENA, ANCA, anti-CCP e fator reumatóide negativos, serologias VIH, VHC e VHB não reativas. Colhidos 2 sets de hemoculturas, que se mostraram estéreis. Efetuada serologia de Borrelia burgdorferi IgM que foi positiva. Procedeu-se a confirmação deste exame com recurso a Imunoblott, o qual foi igualmente positivo. A pesquisa de anticorpos de Borrelia no líquido cefalorraquidiano foi negativa. O doente não apresentava lesões cutâneas ao exame objetivo do tegumento. Assumida, portanto, doença de Lyme, sem meningite ou encefalite, pelo que iniciou doxiciclina 100mg que cumpriu durante 28 dias, tendo assistido a resolução da febre e normalização dos parâmetros inflamatórios.
Discussão: As manifestações clínicas da doença de Lyme podem ser divididas em três fases distintas: precoce localizada, precoce disseminada e tardia. Neste caso a doença encontrava-se na segunda fase com síndrome febril, encefalopatia e artralgias. Este caso demonstra a importância de Doença de Lyme como diagnóstico diferencial, mesmo num doente sem contexto epidemiológico inequívoco.