Diana Mendes Oliveira, Miguel Carvalho, João Enes Silva, Margarida Freitas Silva, Jorge Almeida
Introdução: A amiloidose AA é uma patologia sistémica caracterizada pela deposição extracelular de proteína sérica amiloide A. Existe geralmente um órgão mais afetado (o rim em 80-90% dos casos, maioritariamente com proteinúria nefrótica); outras manifestações incluem cardiomiopatia, síndrome do túnel cárpico ou hepatoesplenomegalia. Existem várias etiologias possíveis, nomeadamente estados que confiram inflamação sistémica sustentada: artrites, vasculites, infeções crónicas ou neoplasias.
Caso clínico: Este caso clínico trata de um homem de 42 anos, paraplégico há 18 anos na sequência de um acidente de trabalho, a condicionar o aparecimento de úlceras trocantéricas bilaterais com alguns meses de evolução e provável doença renal crónica, sem seguimento médico prévio. Foi internado inicialmente por choque séptico com origem em úlceras infetadas, excluída a presença de osteomielite por ressonância magnética, a condicionar disfunção multiorgânica (neurológica, cardiovascular, respiratória, hematológica e renal) com necessidade de suporte invasivo de órgão. A disfunção renal permaneceu após a resolução do quadro agudo, tendo-se mantido em terapêutica de substituição da função renal por técnica de hemodiálise 3 vezes por semana. Do estudo etiológico realizado, a destacar: ecografia renal com rins de dimensões reduzidas, sustentando a hipótese de cronicidade; face a estes achados, considerou-se não haver benefício em realizar biópsia renal; a análise de urina de 24 horas relevou proteinúria de 19 g/L; a imunofixacão urinária e sérica confirmaram a ausência de excreção de cadeias leves, assim como a electroforese de proteínas séricas excluiu gamapatia monoclonal. Em conjunto, estes dados permitiram excluir o diagnóstico de amiloidose primária AL. Foi também pedida pesquisa de amilóide na gordura abdominal, que consegue estabelecer o diagnóstico em 80% dos casos; contudo, o resultado foi negativo. Por manutenção de suspeita forte de amiloidose, foi realizada pesquisa de amiloide nas glândulas salivares, que foi positiva “(…) depósitos acelulares, amorfos, eosinofílicos em localização peri-acinar e periductal, focalmente na parede de vasos, com refringência verde-maçã sob luz polarizada (com coloração Vermelho do Congo)”. A
Discussão: A infeção crónica é responsável por 9-15% dos casos de amiloide secundária, sendo as infeções classicamente associadas a osteomielite e a tuberculose. O prognóstico é reservado se não for tratada a patologia inicial. Neste caso, dada a cronicidade das lesões cutâneas e o diagnóstico tardio de doença renal, não foi possível travar a deposição de amiloide e suas consequências com medidas farmacológicas. Este caso pretende deixar-nos alerta para o diagnóstico precoce de estados inflamatórios sistémicos, nomeadamente úlceras de pressão, cada vez mais comuns na população envelhecida, que podem levar à instalação de sequelas irreversíveis.