Inês da Mata, Joana Marques, Ana Reis, Fernando Gonçalves
Os síndromes paraneoplásicos são muitas vezes a primeira manifestação de uma doença maligna. As glomerulopatias são um destes exemplos, podendo manifestar-se como síndrome nefrótico. A glomerulonefrite membranosa manifesta-se muitas vezes como síndrome nefrótico e está bem descrita como associada a tumores sólidos, principalmente gastro-intestinais e pulmonares. Nos linfomas não-hodgkin esta associação está pouco descrita.
Apresenta-se o caso de um homem de 68 anos, autónomo nas atividades de vida diárias com história de doença pulmonar obstrutiva crónica, hipertensão arterial essencial, dislipidémia, hábitos etanólicos acentuados e tabágicos e obesidade grau I. Referenciado do serviço de urgência à consulta de Medicina Interna por hematúria macroscópica e perda ponderal (12Kg em cerca de 4 meses); negou queixas urinárias, alteração do débito urinário, edema periférico ou periorbitário; sem outros sintomas associados. Ao exame objetivo destacava-se apenas hepatomegália indolor palpável 1-2 cm abaixo do rebordo costal, ligeiro edema periférico, sem outras alterações. Analiticamente com hematoproteínuria, disfunção renal não conhecida anteriormente (creatinina 2,30 mg/dL), doseamento de proteínas das 24H com proteinúria de 5194mg/24H e eletroforese das proteínas com hipoalbuminemia. A TC de ambulatório revelava volumoso nódulo sólido com cerca de 4 cm, anterior à veia cava inferior sem plano de clivagem evidente do lobo caudado do fígado. Para melhor caracterização do nódulo realizou RM abdominal que confirma a existência de uma massa entre o lobo caudado do fígado, a cabeça do pâncreas e a veia cava inferior com cerca de 6,9x4,9x5,7cm de características inespecíficas. Fez biópsia da lesão cujo estudo anátomo-patológico foi compatível com linfoma não hodgkin de células B. Assumiu-se o diagnóstico de glomerulonefrite membranosa paraneoplásica provável, embora não tenha sido realizada biópsia tendo em conta o risco/benefício, em contexto de neoplasia linfóide. Não apresentava doença à distância, tendo sido referenciado à consulta de Hematologia e iniciado quimioterapia com R-CHOP, com normalização da função renal ao 2º ciclo e sem novas queixas de hematúria.
Com este trabalho pretendemos sublinhar a importância do reconhecimento do síndrome nefrótico como síndrome paraneoplásico levando, assim, ao diagnóstico precoce e inicio do tratamento com impacto no prognóstico global do doente.