Ana Filipa Pires, Ana Ferreira Pacheco, Ana Areia Reis, Filipa Leal, Teresa Martins Mendes, Vítor Fagundes, Mari Mesquita
As demências rapidamente progressivas constituem um desafio diagnóstico pelo comprometimento cognitivo, comportamental, psicológico, motor e social. O diagnóstico diferencial deve incluir distinção das causas reversíveis e irreversíveis (causas degenerativas, inflamatórias, neoplásicas e metabólicas).
Os autores apresentam o caso clínico de um homem de 41 anos, com hipertensão arterial, dislipidemia, consumo de 60 g/álcool dia, admitido no Serviço de Urgência por instalação progressiva de desequilíbrio na marcha no último mês e declínio cognitivo a condicionar limitação da realização nas atividades de vida diárias com dois meses de evolução. Objetivamente: vigil, orientado, com movimentos oculomotores decompostos, mas sem limitação, discreto nistagmo horizontal, disartria ligeira, postura distónica do MSE e MIE, que fica em inversão plantar e inversão, com tónus de difícil avaliação pela distonia e movimentos mioclónicos do hemicorpo esquerdo. Analiticamente: sem alteração de marcadores inflamatórios, ionograma, função renal ou hepática ou amónia. TC crânio-encefálico sem alterações. Admitido para investigação etiológica de declínio cognitivo e motor rapidamente progressivo. Estudo analítico: Vit B12, ácido fólico, função tiroideia normais; proteinograma sem picos monoclonais, sem elevação das cadeias kappa ou lamba, VDRL negativo, serologias para HIV, HCV, HBV, Rickettsia, Borrelia burgdorferi negativas, sem elevação de IgA IgG e IgM, ANAs e ANCAs ;sem consumo de complemento; Fator reumatoide,Fatores anti núcleo negativos,B2 glicoproteína e anticardiolipina negativos. EEG com frequências mistas, predominantemente lentas. RMN com Hipersinal difuso e simétrico dos núcleos caudados e putamen, com atingimento sobretudo da vertente anterior, ao qual de associa hipersinal cortical difuso nas regiões fronto-parietais à direita. Perante estes resultados, foi colocada suspeita de Doença de Creutzfeldt-Jakob(DCJ). LCR com pesquisa de proteína 14-3-3 positiva. Durante internamento manteve agravamento rápido do estado neurológico e faleceu 1 mês após o diagnóstico. Aguarda resultado de anatomia patológica. Todas as medidas de preparação da família e preparação do cadáver foram programadas.
A DCJ é uma doença priónica neurodegenerativa e progride inexoravelmente assim que os sintomas clínicos aparecem. Apesar de rara, deve ser equacionada nos quadros demenciais rapidamente progressivos. O caso clínico supracitado constitui uma DCJ provável, de acordo com os critérios clínicos propostos pelos Centers for Disease Control and Prevention (CDC), demência progressiva, sintomas cerebelosos e extrapiramidais, associado a alterações do EEG e hiperintensidade nos gânglios da base na difusão na RMN, tendo sido excluídas as principais causas de demências, tóxicas, metabólicas e infeciosas.