Inês Nogueira da Fonseca, Inês Goulart, Diana Palacios, Laura Pereira, Tiago Petrucci, Ana Teresa Pina, Cristina Alcântara, Carlos Moreira
Introdução: A drepanocitose é uma doença com envolvimento multiorgânico, com importante repercussão no risco vascular dos doentes. À medida que a esperança média de vida dos doentes com drepanocitose aumenta, também as suas complicações se tornam mais prevalentes. Nesta doença, está extensivamente estudada a hipertensão pulmonar e as suas repercussões nas cavidades direitas, por oposição à avaliação do coração esquerdo. Os autores trazem um estudo da função cardíaca esquerda nestes doentes.
Métodos: Trata-se de um estudo prospectivo de doentes recrutados para a Consulta de Hipertensão do Hospital de Santa Maria, Centro Hospitalar Lisboa-Norte, com diagnóstico de drepanocitose. Foram realizados colheita de história clínica, exame objectivo, avaliação laboratorial sumária e ecocardiograma. De acordo com o valor de pressão arterial, os doentes foram divididos em hipertensos e não-hipertensos e, depois, ambos comparados com um grupo de controlo com ajuste à idade, sexo e factores de risco cardiovascular. Os modelos estatísticos utilizados foram t-student e ANOVA, para p<0.01.
Resultados: o estudo incluiu 42 doentes com drepanocitose, 24 deles com hipertensão e 18 sem hipertensão, confrontados com 21 doentes do grupo de controlo, com ajuste à idade, sexo e factores de risco cardiovascular. O IMC, perfil lipídico e função renal não apresentavam diferenças estatisticamente significativas.
Os valores de massa do ventrículo esquerdo (VE) foram os seguintes: no grupo de controlo (C) 95.6±18.2g/m2; drepanocitose sem hipertensão (D): 110.3±21.2g/m2, drepanocitose com hipertensão (D+H): 132.4±19.6g/m2, p<0.001. A fracção de ejecção do VE não apresentou diferença estatisticamente significativa.
Conclusão: Nos doentes com hipertensão, é espectável a presença de hipertrofia ventricular esquerda; contudo, importa lembrar que este marcador ecocardiografico pode anteceder o diagnóstico de hipertensão. Assim, pode equacionar-se que o doente com drepanocitose apresenta risco vascular aumentado e que a doença pode representar um importante factor de risco vascular independente, o que pode vir a alterar a intensidade do esforço terapêutico. São necessários mais estudos para a melhor caracterização deste efeito.