Nuno Vieira Brito, Joana Santos, Tiago Quaresma, Paula Alcântara
As infecções a parainfluenza (HPIV) são sazonais, afectam principalmente as crianças e têm habitualmente um curso benigno. As reinfecções ocorrem ao longo da vida estando os idosos e imunocomprometidos em risco para complicações graves. A pneumonia a HPIV3 em adultos é rara e habitualmente ocorre em doentes com grave compromisso da imunidade.
Mulher de 55 anos com diabetes tipo1 diagnosticada aos 36 e com neuropatia. Múltiplos internamentos por cetoacidose. Uma semana antes quadro de náuseas, vómitos e diarreia liquida profusa. Por manutenção do quadro clinico mais prostração intensa recorre ao SU onde é admitida por cetoacidose diabética. Negava queixas de outros órgãos ou sistemas, nomeadamente respiratórias e febre. Na admissão polipneica e hipotensa com pH de 6.9, cetonemia de 6.5, glicemia de 486, sat.O2 96%, leucocitose de 19800 com 85,3% neutrófilos sem outras alterações para além de hemoconcentração e PCR negativa. Na radiografia de toráx infiltrado intersticial difuso com aspecto exsudativo. Nos 3 dias seguintes desenvolve quadro de dificuldade respiratória (ARDS). Os exames microbiológicos, antigenúrias e serologias para agentes atípicos e vasculites foram todos negativos. Transferida para UCI em D3 com diagnóstico de ARDS e colocada sob VNI com FiO2 de 100%. Realizada broncoscopia com LBA e TC torácica que mostraram LBA muito viscoso e turvo com estudo citológico inconclusivo e alteração difusa do parênquima pulmonar de ambos os campos pulmonares, com densificação difusa em vidro despolido e áreas poupadas, existindo ainda algumas zonas de crazy paving, respectivamente. Clinicamente a doente mantém-se sob VNI com O2 a 100% . Um segundo LBA mostrou presença de células gigantes tipo corpo estranho e contagem celular insuficiente para imunofenotipagem. Exames microbiológicos do LBA foram negativos excepto sonda para vírus respiratórios positiva para HPIV3. A doente evoluiu favoravelmente sob terapêutica de suporte, sem necessidade de ventilação invasiva, e retornou à enfermaria em D10 e alta em D17 para reabilitação respiratória.
A pneumonia a HPIV3 é rara em adultos imunocompetentes. Contudo é descrita em indivíduos imunocomprometidos como são os doentes submetidos a transplante de medula óssea. Quer nestes, quer em crianças com agamaglobulinémias tem sido descrita pneumonia de células gigantes (PCG) induzida pelo HPIV3 e com mortalidade superior a 40%; numa destas crianças foi descrita associação com proteinose alveolar, hipótese colocada na nossa doente em face do LBA viscoso e turvo e o padrão crazy paving na TC. Nos diabéticos e relacionado com o grau e duração da hiperglicemia e frequência de cetoacidose estão descritas perturbações mais ou menos graves da imunidade pulmonar, desde a defesa imunitária dependente do surfactante, assim como múltiplas funções dos neutrófilos e macrófagos. Estes aspectos podem justificar perturbação imunitária suficiente para desenvolver PCG a HPIV3 com curso benigno.