Dora Lameiras Xete, Andrea Castanheira, Manuela Zita Veiga, Isabel Madruga
INTRODUÇÃO: As neoplasias malignas do intestino delgado (ID) são raras e representam, cerca de 2 a 3% das neoplasias gastrointestinais. Os adenocarcinomas (ADC) são entre as neoplasias do ID, o tipo histopatológico mais comum. Mais de 50% dos ADC ocorrem no duodeno, sendo habitualmente diagnosticados por endoscopia digestiva alta (EDA).
CASO CLINICO: Mulher de 55 anos de idade, autónoma, natural do Brasil, a residir em Portugal há cerca de 18 anos. Sem antecedentes de relevo. Recorreu ao serviço de urgência (SU) por quadro de náuseas, vómitos, perda ponderal de cerca de 8 Kg em 6 meses e obstipação com cerca de 20 dias de evolução. Foi previamente observada três vezes em SU e medicada sintomaticamente sem melhoria. Nega alterações do trânsito intestinal. Ao exame objectivo: pele e mucosas coradas, desidratadas, com turgor cutâneo diminuído, anictéricas. Hemodinamicamente estável. Apirética. A avaliação abdominal era inocente, sem massas ou organomegalias palpáveis. Sem outras alterações de relevo. Do estudo complementar salientam-se as seguintes alterações: Glicemia de 143 mg/dL; Hb de 16,6 g/dL; Ligeira leucocitose e neutrofilila com PCR negativa; Lesão renal aguda (LRA) AKIN 2, hiponatrémia e hipokaliémia. Citólise ligeira e discreta elevação da lipase. Realizou ecografia abdominal e renal que não revelaram alterações. Foi internada por LRA de etiologia pré-renal no contexto de vómitos. Manteve trânsito intestinal escasso para fezes e gases apesar de laxantes em esquema, mantendo quadro de náuseas e vómitos apesar de associação de anti-eméticos. Foi entubada nasogastricamente com evidência de estase gástrica (350 cc a 2000 cc/dia). Realizou EDA sem evidência de lesão gástrica com biópsia revelando H. Pylori e TC abdominal em que se destacou uma massa heterogénea a nível da 3a porção do duodeno, de limites mal definidos (2 x 2 x 2 cm). Foi pedida colaboração de Cirurgia e pedida eco-endoscopia que revelou dilatação duodenal e no jejuno, angulação e fixação não franqueável, em provável relação com estenose jejunal maligna. Foi intervencionada cirurgicamente para excisão do tumor, confirmado o diagnostico de ADC jejunal, tendo sido também constatado implante carcinomatoso no grande epiplon e posteriormente iniciada quimioterapia. Ao 8º mês após o diagnóstico, mantém-se em follow-up, sem evidência de recidiva.
DISCUSSÃO: As neoplasias do ID constituem um diagnóstico invulgar e desafiante, por vezes tardio, devido a inespecificidade do quadro sintomático que resulta, habitualmente, de uma complicação aguda, como o quadro descrito de oclusão intestinal. Segundo a literatura mais de metade dos doentes apresentam metástases no momento do diagnóstico. O diagnóstico é conseguido perante um índice de suspeição elevado, sendo que o recurso a meios complementares disponíveis é considerado chave na investigação de sintomas persistentes. O caso apresentado é particular tanto pelo envolvimento do intestino delgado como pela sua localização.