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TUBERCULOSE PERITONEAL E MIELOFIBROSE – MERA COINCIDÊNCIA?
Doenças infeciosas e parasitárias - Caso Clínico
Congresso ID: CC063 - Resumo ID: 1566
Hospital de São Pedro, Vila Real - CHTMAD
João Carvalho, Cristina Lameirão Gomes, Sandra Morais, Vanessa Pires
Introdução
A tuberculose peritoneal é uma patologia rara e está incluída na forma abdominal de tuberculose extrapulmonar. A sua apresentação clínica é inespecífica o que dificulta muitas vezes o diagnóstico. A mielofibrose é um distúrbio clonal de uma célula hematopoiética multipotente e que cursa com fibrose da medula óssea, hematopoiese extra medular e esplenomegalia. A coexistência destas duas entidades tem sido descrita com uma frequência que levanta a possibilidade de uma provável relação entre estas duas patologias, para além do mero acaso.

Caso clínico
Homem de 68 anos, regressado há 6 meses da França, onde esteve emigrado durante 10 anos. Sem seguimento regular em cuidados de saúde ou antecedentes patológicos descritos, salientando-se um consumo etílico diário de cerca de 80 g.
Recorreu ao serviço de urgência por clínica com 3 meses de evolução de dejeções diarreicas, dor e aumento do perímetro abdominal. No último mês referia ainda anorexia e perda ponderal> 10%. Ao exame objetivo apresentava-se emagrecido, febril (Taur 39-40ºC), com dor difusa à palpação abdominal e esplenomegalia; anictérico e sem adenomegalias palpáveis.
Estudo analítico: hemoglobina 11.60 g/dL, hiponatrémia 129 mEq/L, hipercaliémia 5.6 mEq/L, desidrogenase láctica (DHL) 2233 U/L, proteína C-reativa 6.10 mg/dL (N <0,5), INR 1.48 e aPTT 42.5s. Marcadores víricos: contacto prévio com VHB e restantes negativos (VHC, VIH 1 e 2). Esfregaço de sangue periférico sugestivo de mielofibrose, hipótese posteriormente confirmada por biópsia óssea.
TAC toraco-abdomino-pélvico com hepatomegalia, esplenomegalia exuberante (29 cm), ascite de moderado volume e sem adenopatias. Líquido ascítico compatível com exsudado (2250 leucócitos/uL com 74% de células mononucleares), glicose 54 mg/dL, gradiente sero-ascítico de albumina (SAAG) 0.6 e adenosinadeaminase (ADA) 85.3 U/L (N <20 U/L); pesquisa de BAAR e células malignas negativa. IGRA positivo. PET sugestivo de envolvimento maligno mesentérico, peritoneal, esplénico e, provavelmente, pulmonar e ganglionar mediastino-hilar. Face à suspeita diagnóstica de tuberculose peritoneal, foi decidido iniciar terapêutica anti-bacilar (esquema quádruplo). Após 6 semanas de internamento, o exame cultural do líquido ascítico foi positivo para Mycobacterium tuberculosis.
Boa evolução clínica com completa resolução dos sintomas, mantendo seguimento em consulta de Medicina e Hematologia.

Discussão
Desde 1947 tem sido descrita a associação entre tuberculose e mielofibrose havendo, inclusive, casos de reversibilidade da fibrose após terapêutica anti-bacilar, o que reforça ainda mais essa ideia. A fisiopatologia não se encontra esclarecida; desconhece-se se a tuberculose induzirá uma reação fibrótica da medula óssea ou se esta apenas se desenvolve em indivíduos com doença mieloproliferativa pré-existente. Neste caso, a repetição de biópsia óssea seria de particular interesse para avaliar se houve regressão do grau de fibrose ou não.