NDCM, 31 anos, com antecedente de talassemia minor. Sem medicação habitual ou alergias medicamentosas, com hábitos tabágicos no passado de 10 UMAs. Aparentemente saudável até aparecimento de dor inguino-escrotal esquerda autolimitada com 2 anos de evolução, com ecografia testicular sem alterações em avaliação pelo médico assistente. Apresentava imagem nodular parenquimatosa estável em radiografias de tórax seriadas, tendo sido referenciado ao Centro Diagnóstico Pneumológico por suspeita de Tuberculose. Inicia entretanto tosse, expectoração hemoptoica, diaforese de predomínio nocturno, perda ponderal e febre (temperatura timpânica máxima de 38ºC) com 2 meses de evolução. Por apresentar aumento radiológico do nódulo já conhecido, ainda que com pesquisa de bacilos álcool-ácido resistentes (BAAR) na expectoração negativa e cultura BACTEC negativa aos 30 dias, realizou TAC de tórax em ambulatório que revelou a presença de condensações multifocais e periféricas, de aspecto relativamente invulgar e sugestivas de patologia inflamatória, com gânglios no mediastino anterior agrupados, com dimensões dentro da normalidade. Realizou broncofibroscopia ainda em ambulatório sem alterações, com lavado bronco-alveolar de baixa celularidade constituído por células pavimentosas, linfócitos e polimorfonucleares, com pesquisa de células neoplásicas, fungos, BAAR, P. jirovecii e PCR para BK negativos. Recorreu ao nosso serviço de urgência por recidiva de hematúria, tendo no episódio de urgência prévia noutro Hospital apenas realizado lavagem vesical e avaliação analítica que revelou Hb 10,5 g/dL (anemia microcítica e hipocrómica), PCR 5,0 mg/dL, com alta após apresentar urina clara. Neste episódio foi pedida ecografia renal que foi convertida em TAC abdómino-pélvica, que revelou neoformação renal esquerda, com trombose tumoral da veia renal homolateral e atingimento da veia cava inferior, com envolvimento pulmonar e ósseo secundários. Em internamento foi realizada biópsia renal que confirmou diagnóstico de carcinoma de células renais associado a translocação Xp11.2/gene TFE3, tendo realizado nefrectomia citorredutiva e cavotomia com trombectomia da veia cava, tendo iniciado quimioterapia adjuvante com Sunitinib. Posteriormente apresentou trombose da veia porta intra-hepática apesar da anticoagulação terapêutica com Enoxaparina, com progressão de doença para metastização hepática e carcinomatose peritoneal, falência hepática progressiva, acabando por falecer passados 3 meses.
A apresentação deste caso clínico pretende chamar a atenção para uma apresentação inicialmente indolente e atípica sem hematúria inaugural de carcinoma de células renais, mimetizando outras patologias inflamatórias sistémicas como a tuberculose, atrasando-se assim o diagnóstico de uma situação potencialmente fatal.