Gisela Vasconcelos, Dalila Parente, Catarina Couto, Lígia Santos, Inês Oliveira, Alice Castro, Mari Mesquita
Introdução: A endocardite infeciosa caracteriza-se pela infeção das estruturas valvulares cardíacas ou do endocárdio mural. Constituem fatores de risco a presença de alterações ou próteses valvulares, bem como alterações cardíacas congénitas. Tem apresentações clínicas diversas, e a sua incidência e mortalidade tem-se mantido constantes apesar de avanços nos métodos diagnósticos e terapêuticos.
Caso Clínico: Homem, 74 anos. História de hipertensão arterial, insuficiência cardíaca de etiologia valvular (estenose aórtica severa; válvula mitral com padrão reumático e insuficiência severa), espondilose lombar e discopatia, submetido a nucleoplastia de hérnia discal lombar. Quadro constitucional com cerca de 4 meses de evolução. Realizado estudo analítico e imagiológico em ambulatório, sendo de destacar anemia normocítica e normocrómica e baço com área hipodensa e hipocaptante, sugestiva de enfarte esplénico. Admitido a internamento. Ao exame físico de referir aspeto emagrecido, febre, mucosas descoradas, cáries dentárias e sopro sistólico grau III/VI, audível em todo o precórdio. Analiticamente anemia de estados inflamatórios e elevação dos parâmetros inflamatórios sistémicos. Ecocardiograma transtorácico com vegetação na face auricular da cúspide anterior da válvula mitral, de aproximadamente 15mm, móvel, encontrando-se preservada a função sistólica global biventricular. Iniciada antibioterapia empírica para endocardite de válvula mitral nativa. Repetiu TC toraco-abdomino-pélvica, confirmando-se enfarte esplénico, sem evidência de outras lesões. TC crânio-encefálico (CE) sem sinais de lesões agudas. Isolamento de Granullicatela Adiacens nas hemoculturas. Evolução inicial com resposta clínica e analítica favoráveis sob antibioterapia dirigida, aguardando teste de sensibilidade antimicrobiana e realização de ecocardiograma transesofágico. Desenvolvimento súbito de quadro de cefaleia, vómitos e depressão do estado de consciência. Repetido TC CE, constatando-se extensa área lesional cerebelosa, hipodensa e hemorrágica recente. Assim, endocardite bacteriana, complicada com embolização sistémica e hemorragia cerebral. Evoluiu desfavoravelmente, verificando-se o óbito.
Conclusão: A presença de patologia valvular mitral constituiu um fator de risco para desenvolvimento de endocardite. Neste doente, a existência de cáries dentárias, e o agente isolado, pertencente à flora oral, torna este o foco mais provável. Como se verificou neste caso, de destacar o risco de embolização sistémica, associado às endocardites de válvula nativa esquerda. Estas têm frequentemente indicação cirúrgica precoce, nomeadamente na presença de insuficiência cardíaca, abcesso intracardíaco ou má resposta à antibioterapia. Embora ausentes estes fatores, as características da vegetação determinaram a ocorrência de complicações e evolução para um desfecho desfavorável.