Serviço de Medicina 2.3, Hospital de Santo António dos Capuchos, Centro Hospitalar Universitário Lisboa Central
Título: Tenosinotive, artralgias e dermatite gonocócica – relato de um caso.
Introdução: A infecção gonocócica disseminada é uma forma de apresentação rara da infecção por Neisseria gonorrhoeae. A tríade de tenosinovite–poliartralgia–dermatite é menos reconhecida do que a forma de artrite purulenta mas deverá ser considerada em doentes com comportamentos sexuais de risco sobretudo quando assistismos a um novo aumento da incidência de infecções sexualmente transmissíveis (IST’s).
Caso clínico: Mulher de 23 anos, educadora de infância, sem antecedentes de relevo, recorre ao serviço de urgência (SU) por redução da força muscular e dor no antebraço e mão do hemicorpo direito. Referia instalação súbita das queixas dois dias antes, inicialmente com parésia da flexão do antebraço e mão, posteriormente associada a dor e impotência funcional. No dia seguinte nota disestesias nos primeiros três dedos da mão direita e aparecimento de uma lesão cutânea no punho direito. Negava traumatismo, febre ou queixas de órgão nomeadamente disúria, polaquiúria ou corrimento uretral. Referia contacto sexual desprotegido com um parceiro dois meses antes. À observação apresentava: dor intensa à palpação e mobilização activa / passiva do cotovelo, joelho e punho direitos, sem edema, eritema ou calor articular; mancha eritematosa na face anterior do punho direito que progredia distalmente para a face palmar da mão, muito dolorosa ao toque; uma pequena pústula no antebraço esquerdo; e, ainda, hipostesia no território do nervo mediano direito. Analiticamente a destacar leucocitose com neutrofilia, Proteína C Reactiva (PCR) 127mg/L, e piúria estéril. O diagnóstico imunológico de gravidez foi negativo. Considerando quadro inflamatório agudo caracterizado por artralgias, provável tenosinovite da mão direita, exantema pustular e piúria estéril numa mulher jovem com história de relações sexuais desprotegidas, colocou-se a hipótese de infecção gonocócica disseminada. As alterações de sensibilidade foram interpretadas no contexto de eventual nevrite do mediano por contiguidade com sinóvia inflamada. Foi iniciada antibioterapia empírica com Ceftriaxone 1g intra-muscular durante 7 dias e Azitromicina 1g toma única com resolução total das queixas. A pesquisa de Neisseria gonorrhoeae e Chlamydia trachomatis por PCR em tempo real foi positiva na urina e exsudados orofaríngeo e cérvix. As serologias para outras IST’s foram negativas. Onze meses após o diagnóstico a doente encontra-se assintomática.
Discussão: O melhor controlo da infecção pelo vírus da imunodeficiência humana e o advento de profilaxias pré e pós-exposição têm causado um aumento dos comportamentos sexuais de risco e, consequentemente, da transmissão de IST’s. Neste contexto, importa reconhecer as formas de apresentação de doenças como a infecção gonocócica disseminada. Esta patologia deve ser considerada em qualquer doente com práticas sexuais de risco que se apresente com tenosinotive aguda, artralgias ou artrite.