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EPIDEMIOLOGIA E BOM SENSO – A PROPÓSITO DE UM CASO DE PERITONITE TUBERCULOSA.
Doenças infeciosas e parasitárias - E-Poster
Congresso ID: P519 - Resumo ID: 1897
Serviço de Medicina 2.3, Hospital de Santo António dos Capuchos, Centro Hospitalar Universitário Lisboa Central
António Epifânio Mesquita, Ana Filipa Palma dos Reis, Ana Luísa João, Rui Malheiro, Catarina Patrício, Vitor Brotas
Introdução: A Tuberculose é uma doença bem conhecida em Portugal. Embora se assista a uma redução da sua incidência, importa reconhecer as suas formas de apresentação, nomeadamente as menos comuns, como a peritoneal. Sobretudo nos grandes centros urbanos, onde há grandes comunidades de imigrantes, um bom conhecimento epidemiológico, no contexto clínico certo, poderá ser diagnóstico.

Caso clínico: Homem de 35 anos, natural do Nepal a residir em Portugal há 2 anos, com história conhecida de etanolismo crónico moderado, internado por febre, diarreia e aumento do volume abdominal com 10 dias de evolução. Negava sudorese nocturna, perda de peso, dor abdominal, enfartamento, pirose, náuseas, vómitos, melenas, hematoquézias, rectorragias, icterícia, colúria, tosse ou hemoptises. À observação apresentava temperatura timpânica de 38.8ºC e macicez flutuante na exploração semiológica do abdómen. Não se palpavam adenopatias ou organomegálias e não eram visíveis estigmas de doença hepática crónica. Analiticamente destacava-se anemia normocítica e normocrómica, Proteína C Reactiva (PCR) 185 mg/L, sem leucocitose, e serologia para vírus da imunodeficiência humanda (VIH) negativa. Realizou Tomografia Computorizada (TC) abdomino-pélvica que demonstrou ascite em todos os recessos peritoneais e aspectos sugestivos de omental cake a nível do grande epíploon. O exame bioquímico do líquido ascítico foi compatível com exsudado. O exame citológico do líquido revelou presença de 1195 células/uL das quais 1000 células eram mononucleares, sem presença de células neoplásicas. A adenosina desaminase (ADA) encontrava-se acima do valor normal; o teste de amplificação de ácidos nucleicos para foi negativo para Mycobacterium tuberculosis complex. Considerando todos os achados clínicos e laboratoriais, associados ao relevante contexto epidemiológico do doente, decidiu-se iniciar terapia tuberculostática quádrupla empiricamente. Uma semana após início da terapêutica o doente estava apirético e com melhoria considerável do volume abdominal. Foi ponderada a realização de biópsia peritoneal laparoscópica mas optou-se por não a realizar e aceitar prova terapêutica como diagnóstica. O doente teve alta referenciado ao Centro de Diagnóstico Pneumológico (CDP). Doze dias depois obteve-se confirmação do diagnóstico com isolamento de Mycobacterium tuberculosis no exame cultural de micobactérias do líquido ascítico, comunicado ao CDP.

Discussão: Na Tuberculose, o diagnóstico microbiológico assume particular relevância perante a possibilidade de resistência à terapêutica. Porém, no caso apresentado, a clínica sugestiva, o contexto epidemiológico muito relevante, e a resposta favorável à terapêutica empírica, determinaram a decisão de não perseguir um método de diagnóstico invasivo. Este caso representa situações da prática clínica diária em que “o óptimo é inimigo do bom” e o que está recomendado entra em conflito com o considerado seguro ou benéfico.