Joana Gomes Cochicho, José Miguel Silva, Socrates Vargas Naranjo, Ruben Raimundo, Adriano Pacheco Mendes, Sara Viana, Rita Parente, Ana Neves, Maxim Suleac, André Mendes, Armando Nodarse, Isabel Soles
Introdução: No adulto jovem, o acidente vascular cerebral (AVC) constitui uma entidade rara e que implica um rigoroso esclarecimento etiológico. O caso clínico que apresentamos revela-se interessante pela combinação de múltiplos factores que constituem uma explicação etiológica para o evento cerebral.
Caso clínico: Doente do sexo feminino, de 42 anos, leucodérmica que recorre ao Serviço de Urgência (SU), por quadro de cefaleia, desvio da comissura labial à direita e parestesias e discreta diminuição da força no membro superior direito. A tomografia computorizada crânio-encefálica era compatível com o diagnóstico de AVC.
A doente apresentava como antecedentes pessoais relevantes diabetes mellitus tipo 1 (DM 1), nefropatia de provável etiologia diabética, hipertensão arterial (HTA), dislipidémia e hábitos tabágicos marcados. Medicada habitualmente com insulina detemir, insulina lispro, perindopril, bisoprolol, rosuvastatina, colecalciferol, omeprazol, pentoxifilina, ácido acetilsalicílico, lorazepam e escitalopram (embora com má adesão terapêutica).
A doente foi internada, tendo iniciado investigação etiológica.
Dos exames complementares, destacamos o ecocardiograma transtorácico com evidência de comunicação interauricular, dilatação das cavidades esquerdas, acinésia de múltiplos segmentos do ventrículo esquerdo e função sistólica diminuída.
Relativamente a testes genéticos, revelou-se portadora do gene PAI-1 5G/4G^2 (em homozigotia) e do gene MTHFR 1298A>C^2 (em heterozigotia).
Apresentava doseamento de homocisteína discretamente aumentado para a idade e serologias positivas para VHC e borrelia burgdoferi.
Discussão: O esclarecimento etiológico do AVC é importante para o tratamento e prevenção secundária. Múltiplos fatores de risco foram identificados nesta doente, mas a causa primordial é difícil de estabelecer. Todos os factores podem ter contribuído para o desfecho final (AVC), no entanto, este caso suscita uma interessante discussão sobre qual o factor principal.
Vários factores de risco comprovados de AVC estão presentes nesta doente (HTA, DM 1, dislipidémia, tabagismo, cardiopatia).
Actualmente, admite-se que as mutações genéticas encontradas possam ter um papel importante na formação de trombos.
Adicionalmente, as doenças infecciosas têm sido associadas a disfunção endotelial.
A associação com as patologias cardíacas encontradas, pode desencadear a formação de trombos no sistema arterial, ou a migração dos mesmos.
A marcha diagnóstica é fundamental nos doentes jovens com AVC. Este caso clínico, mostrou-se particularmente interessante pelas múltiplas possibilidades etiológicas encontradas.
A visão holística do internista e a sua capacidade magistral de investigador revelam-se fundamentais no rigor diagnóstico.