Carolina Silva, Luísa Serpa Pinto, Ana Rita Costa, Ana Rita Cruz, Álvaro Ferreira, João Araújo Correia
INTRODUÇÃO: A tuberculose (TB) apresenta prevalência crescente a nível mundial, sendo que a TB vertebral corresponde à apresentação mais comum da TB óssea. Os segmentos inferiores da coluna dorsal são os mais comumente atingidos e a infeção geralmente atinge a região anterior dos corpos vertebrais; o envolvimento de vértebras contíguas é comum e abcessos paravertebrais podem estar presentes.
O diagnóstico baseia-se em técnicas culturais e/ou histológicas; em alguns casos, a presença de inflamação granulomatosa com necrose central pode justificar o início de tratamento. No entanto, a atraso no diagnóstico é frequente, dado o curso indolente da doença, pouca especificidade dos sintomas e o facto de muitos clínicos não estarem familiarizados com as manifestações ósseas da TB. Além disso, o exame cultural não é totalmente sensível.
CASO CLÍNICO: Mulher de 73 anos, sem antecedentes prévios. Assintomática até há 8 meses, altura em que inicia dor dorsal progressiva, incapacitante, associada a paraparésia grau 4/5 dos membros inferiores desde há cerca de três semanas e perda ponderal progressiva de 8%. Tomografia computadorizada da coluna vertebral a revelar lesão osteolítica das regiões anteriores dos corpos vertebrais de D10-D12 e respetivo espaço intervertebral. Biópsia vertebral com apresentação histológica de infiltrado linfohistiocitário e granulomas epitelioides. Estudo micobacteriológico negativo, com cultural estéril.
Admitida para estudo da lesão. Ressonância magnética a revelar destruição vertebral e dos discos intersomáticos de D10-D12, com abcesso e empiema paravertebrais, com compressão medular. VS=17mm/h. IGRA negativo. Submetida a cirurgia de descompressão medular e realizada nova biópsia vertebral, com isolamento em exame cultural de Mycobacterium tuberculosis complex. Iniciou anti-tuberculostáticos de primeira linha, com boa evolução clínica e aparente recuperação parcial dos défices neurológicos. Referenciada para reabilitação fisiátrica, com indicação para completar doze meses de terapêutica.
DISCUSSÃO: Os autores pretendem demonstrar as dificuldades no diagnóstico de TB vertebral. A manifestações ósseas descritas e o exame histológico da primeira amostra são claramente sugestivas da TB vertebral; no entanto, o exame cultural foi inicialmente negativo e a doente não apresentava elevação da VS ou positividade no teste IGRA. Uma vez que a doente não possuía fatores de risco conhecidos para esta infeção (exceto residir num país com elevada incidência da doença), foi decidido não iniciar terapêutica empírica e procurar outras causas de lesão vertebral. A segunda biópsia permitiu o isolamento do patogénio, mas já numa fase avançada da infeção. Dada a incidência e impacto das complicações neurológicas, é importante ter em consideração o diagnóstico de TB vertebral na presença de quadros clínicos deste tipo, preconizando o mais precocemente possível o início de anti-tuberculostáticos, mesmo sem certeza no diagnóstico.