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CRIOGLOBULINEMIA - UMA CAUSA RARA DE EVENTOS VASCULARES CEREBRAIS
Doenças autoimunes, reumatológicas e vasculites - E-Poster
Congresso ID: P013 - Resumo ID: 217
Centro Hospitalar Vila Nova de Gaia/Espinho
Fábio Murteira, Francisco Sabença, Ivo Castro, Miguel Silva, Pedro Oliveira, Nuno Leal, Pedro Barros, Henrique Moniz Costa, Luis Miguel Veloso, Vitor Paixão Dias
Introdução:
A crioglobulinemia é caracterizada pela presença de crioglobulinas no soro, isto é, imunoglobulinas que precipitam in vitro a temperaturas abaixo da corporal (37 ºC). Pode ser um achado incidental ou provocar dano evidente pela precipitação em pequenos e médios vasos. Existem 3 tipos, a tipo I monoclonal (simples) e as tipo II e III policlonal (mista). Em 90% dos casos a Tipo II está associada a Hepatite C (HCV) crónica.
Caso clínico:
Homem, 51 anos, com HCV crónica (diagnóstico há 21 anos, sem seguimento ou tratamento), ex-consumidor de drogas endovenosas e ex-fumador. Recorreu ao Serviço de Urgência (SU) durante o Verão, por instalação súbita de hemiparesia direita e disartria com início no dia anterior. À admissão tinha paresia facial central direita, hemiparesia direita grau 4 e ligeira oscilação sem lateralidade evidente (NIHSS 4); hipertenso (190/110 mmHg) e em ritmo sinusal.
No SU realizou Tomografia Computorizada (TC) e AngioTC crânio-encefálico (CE) e de troncos supra-aórticos, sem lesões agudas. Nas análises iniciais com elevação de transaminases (7x-12x a referência) e dislipidemia.
Foi internado por Acidente Vascular Cerebral (AVC) isquémico (LACI motor puro), sem indicação para trombólise (por tempo de evolução e lesão de pequeno vaso). No internamento a Ressonância Magnética (RM) e AngioRM CE demonstraram 3 lesões isquémicas agudas/subagudas em território profundo em ambos os hemisférios e microhemorragias em vários territórios profundos. Para complementar estudo foram pedidos marcadores de auto-imunidade, estudo de trombofilias e fez punção lombar. Teve alta contraparecer médico após recuperação parcial dos défices; aguardava resultados anteriores e angiografia cerebral diagnóstica. Saiu medicado com antiagregação simples, antihipertensor e estatina de alta intensidade.
Após 22 dias retornou ao SU por noção de novos défices do membro superior esquerdo (hemiparesia e hipoestesia); NIHSS 1. Repetiu TC CE e AngioTC sem novas lesões mas irregularidade difusa das artérias intracranianas, indiciando vasculite. Do estudo em curso à alta do internamento prévio: mutação 20210G>A do gene da Protrombina em heterozigotia (risco trombótico 2-3x superior), crioglobulinas Tipo II positivas no soro, ANA e ANCA negativos, sem consumo de complemento e liquor prenunciando resposta inflamatória. Dado quadro compatível com Vasculite do Sistema Nervoso Central por Crioglobulinemia Tipo II associada a HCV, foi iniciada corticoterapia e tratamento (urgente) da infecção HCV (sofosbuvir + velpatasvir 12 semanas). Teve alta para consulta externa após nova RM CE (enfarte agudo no território lentículoestriado) e angiografia (múltiplas lesões de pequeno e grande vaso, compatíveis com vasculite).
Discussão:
O caso alerta-nos para a necessidade de manter alto nível de suspeição em relação a diferentes etiologias nos eventos cerebrovasculares mesmo em doentes com idade superior a 50 anos com factores de risco vascular não tratados ou mal controlados.