Mário Ferraz, Paulo Iacomini, Mariana Popovici, Jorge Fernandes, Matilde Fraga, Claudina Cruz, André Goulart, Rui Barata, Vera Bernardino, Claudia Mihon, Ana Catarina Rodrigues, Eunice Patarata, Catarina Pereira, António Panarra
Introdução
A incidência do carcinoma hepatocelular tem aumentado (1-2% de todos os diagnósticos de neoplasia,maior na Ásia e na África dada a elevada prevalência de vírus hepatotrópicos), sendo considerada a 3ª causa mais comum de mortalidade associada a neoplasia. Apesar de frequentemente associada a cirrose hepática, pode surgir na ausência de um factor de risco definido em até 5% dos casos.
Apenas 5 a 15% dos doentes se apresentam com metastização na altura do diagnóstico, sendo os locais mais comuns o pulmão (45%), nódulos linfáticos e o osso (13-16%). Este local de metastização tem prognóstico reservado com sobrevida mediana de 1 a 2 meses.
A metastização óssea como manifestação inaugural de CHC é rara, existindo escassos casos clínicos descritos na literatura, com 1 artigo de revisão mencionando uma incidência de 0,9%.
Este caso clínico destaca-se pela apresentação rara de uma neoplasia comum, demonstrando a pertinência de uma investigação etiológica extensa, excedendo uma abordagem inicial focada no comum.
Caso clínico
Doente de 74 anos, género masculino, leucodérmico, com história de diabetes mellitus tipo 2 medicado e controlado em ambulatório. Apresenta-se no serviço de urgência por tumefacção da clavícula direita com 1 mês de evolução associado a febre vespertina. Analiticamente com elevação dos parâmetros inflamatórios, realizou tomografia computorizada toraco-abdomino-pélvica a revelar massa clavicular direita de 6cm de maior diâmetro, com destruição acromio-clavicular e lesões sugestivas de metastização hepática. É internado para esclarecimento diagnóstico.
Durante o internamento realizou ressonância magnética: lesão neoformativa acromioclavicular direita de características invasivas com destruição óssea adjacente; Ecografia da tiroide sem alterações; Cintigrafia óssea não conclusiva; Avaliação analítica apenas com elevação da beta-2-microglobulina; Exames endoscópicos sem alterações; Microbiópsia ecoguiada clavicular direita a revelar metastização de carcinoma hepatocelular CAM5.2 +, Hepar 1 +. Discutido em reunião multidisciplinar, sem indicação para terapêutica curativa, sendo proposto para apoio por Medicina Paliativa. Após alta não apresentou status funcional para quimioterapia, vindo a falecer 35 dias após diagnóstico histológico
Discussão
A metastização óssea do carcinoma hepatocelular não só é rara, como também agressiva, não existindo uma abordagem bem definida. De salientar apresentarem-se apenas 24 casos descritos na literatura até Outubro de 2017, sendo que nenhum reportou localização clavicular da metastização. A quimioterapia com sorafenib parece melhorar a sobrevida média, mas requer status funcional adequado para tal. Este caso clínico, embora infrequente, demonstra a necessidade de uma marcha diagnóstica metodológica e cuidada para uma correcta orientação terapêutica, salientando a importância de uma abordagem multidisciplinar para tal, sempre com foco e apoio na Medicina Interna