Angela Ghiletchi, Graça Martins, Maria Helena Pacheco, Lurdes Venâncio, Maria Conceição Loureiro
A pericardite aguda é uma patologia com evolução geralmente benigna e autolimitada podendo, contudo, progredir de forma adversa, com tamponamento cardíaco, pericardite recorrente ou pericardite constritiva. Na maioria dos casos, desconhece-se a sua causa mas, dentro das etiologias conhecidas, a viral é preponderante, perfazendo cerca de 10%. Os vírus respiratórios são banais nas estações frias, sendo bem tolerados e autolimitados, mas com potencial para complicações em populações idosas com várias co-morbilidades. As mais comuns prendem-se com o sistema respiratório, nomeadamente com a sobre-infecção bacteriana, sendo raras as complicações cardíacas primárias, como a pericardite (0.96 a 7% dos casos).
Os autores apresentam o caso de um doente do sexo masculino de 65 anos, com antecedentes de Hipertensão Arterial, Obesidade e Diabetes Mellitus tipo II. Recorreu ao Serviço de Urgência por quadro com cinco dias de evolução de dor retro-esternal, anorexia, vómitos pós-prandiais, cefaleias holocranianas, tosse mucoprodutiva, sensação febril, polidipsia e poliúria. Ao exame objetivo apresentava-se pálido, diaforético, com sons cardíacos hipofonéticos, murmúrio vesicular rude e sinais de estase bibasal. TT 38.5ºC, FC 105bpm, glicémia capilar de 525mg/dL e cetonemia. Sem outras alterações. Dos exames complementares de diagnóstico realizados destacavam-se leucocitose com neutrofilia, trombocitose, hiponatremia, hipercaliemia, PCR 284mg/L, CK 71U/L, hemoculturas negativas e urina II com cetonúria marcada. Na radiografia de tórax observava-se cardiomegalia, retilinização do bordo direito do coração e apagamento dos seios costo-frénicos. O ECG apresentava apenas critérios de baixa voltagem. Na AngioTC observou-se “[…] Volumoso derrame pericárdico, com 30 mm de espessura máxima […] Admite-se repercussão destes achados na contractilidade cardíaca, admitindo-se ventrículo direito de dimensões reduzidas” com concomitante derrame pleural. O ecocardiograma referia “Moderado derrame pericárdico (~14 mm em diástole) circunferencial […]”. Assumiu-se como patologia aguda e, da pesquisa etiológica efetuada, apenas se detetou infeção pelo vírus Influenza A (H3N2), tendo sido excluída neoplasia, patologia auto-imune e outras infeções virais ou bacterianas. Iniciou tratamento com oseltamivir, colchicina, ibuprofeno e insulina. Foram realizados ecocardiogramas seriados para controlo, que demonstraram a diminuição progressiva do derrame pericárdico. O doente encontrava-se assintomático a partir do D6 de internamento.
Com este caso pretende-se sensibilizar para uma complicação menos frequente do vírus Influenza A, que levou a internamento prolongado com potencial para uma evolução desfavorável em doente imunocomprometido. Pretende-se relembrar a clínica e a gestão da Pericardite Aguda, em termos de tratamento farmacológico e evolução, tanto em contexto de internamento como posterior seguimento em ambulatório.