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DERRAME PLEURAL E PERICÁRDICO - UMA SEROSITE INFECCIOSA
Doenças infeciosas e parasitárias - E-Poster
Congresso ID: P526 - Resumo ID: 495
SERVIÇO DE MEDICINA 2, SECTOR B, HOSPITAL DE SANTA MARIA, CENTRO HOSPITALAR UNIVERSITÁRIO LISBOA NORTE, LISBOA, PORTUGAL
Catarina de Sousa Gonçalves, Nuno Reis Carreira, Marisa Teixeira Silva, Rui Victorino
Introdução
A Febre Q é uma zoonose com crescente incidência na Europa, possivelmente subestimada, causada pela bactéria Coxiella burnetti, constituindo uma doença complexa e polimórfica. Apresenta-se habitualmente como autolimitada, com possível progressão para a cronicidade e com complicações potencialmente fatais. A doença aguda manifesta-se mais frequentemente como hepatite e pneumonia, enquanto a doença crónica pode manifestar-se sob a forma de endocardite.

Caso Clínico
Mulher de 67 anos, internada por dispneia no contexto de agravamento de derrame pleural e pericárdico. Refira-se quadro prévio de febre, perda de peso, dor abdominal, com evolução de 2 meses, associado a alteração das provas hepáticas e espessamento e líquido perivesicular documentado em ecografia e TAC de ambulatório, motivando internamento em serviço de cirurgia por colecistite alitiásica. Contexto epidemiológico inocente e antecedentes pessoais irrelevantes. Ao exame objectivo sem sinais de dificuldade respiratória, auscultação com diminuição do murmúrio vesicular no hemitórax esquerdo, macicez à percussão e palpação de adenopatia supraclavicular direita isolada. ECG sem alterações a assinalar. O ecocardiograma mostrava uma fina lâmina de derrame pericárdico, sem sinais de compromisso hemodinâmico, boa função ventricular esquerda, sem alterações segmentares, cavidades direitas normais e sem hipertensão pulmonar.
O estudo laboratorial revelava citocolestase (AST/TGO: 223U/L, ALT/TGP: 293U/L, ALP 220U/L e gGT 150U/L), elevação dos biomarcadores inflamatórios (VS: 53mm; PCR:7 mg/dL; Ferritina: 431ug/L). Marcadores de necrose miocárdica negativos e NT-proBNP dentro da normalidade.
No seguimento do estudo a TC corpo mostrava “derrame pleural bilateral de pequenas dimensões com fina lâmina de derrame pericárdico, sem adenopatias patológicas ou outras alterações”; endoscopia com duodenoscopia: gastrite crónica não ativa, Helicobacter pylori positivo em biópsias. Realizada toracocentese diagnóstica: Líquido pleural compatível com exsudado, com predomínio de linfócitos e células mesoteliais/macrófagos; exame bacteriológico, Ziehl-Neelsen e pesquisa de células neoplásicas negativos. Pelo quadro de serosite, pedido estudo autoimune, que se revelou negativo. O estudo infeccioso revelou positividade para febre Q em fase aguda/convalescença, tendo completado 14 dias de doxiciclina, com benefício clínico e normalização da função hepática.

Discussão:
Neste caso descreve-se uma apresentação atípica de Febre Q, manifestada por colecistite alitiásica, serosite manifestada por derrame pleural e pericárdico a par de quadro consumptivo. Pelo facto da forma crónica da doença ser rara e a sua apresentação tão variada e inespecífica, é fácil passar despercebida. A Febre Q é uma doença globalmente disseminada e um problema de saúde pública major, para o qual os profissionais de saúde devem estar alertados, devendo ser sempre uma hipótese diagnóstica a colocar em casos como o apresentado.