A encefalite autoimune é uma patologia infrequente. Está associada a anticorpos contra proteínas neuronais intracelulares e da superfície neuronal. A mais comum é a associada a anticorpos anti-receptor N-metil-D-aspartato (rNMDA), a qual em cerca de metade dos casos é paraneoplásica, associando-se maioritariamente ao teratoma ovárico em mulheres jovens.
Mulher, 34 anos, previamente saudável, inicia parestesias da mão direita e disartria tendo sido avaliada na Urgência. Após TC cerebral normal, na suspeita de quadro funcional, foi orientada para reavaliação em 1 mês em consulta de neurologia, onde mantinha estes sintomas. No mês subsequente desenvolveu progressivamente insónia e irritabilidade, tendo sido medicada com antidepressivo e ansiolítico mas sem melhoria. Nas 2 semanas seguintes desenvolveu disfunção da linguagem e episódios transitórios de movimentos coreo-atetósicos dos membros direitos. Apresentou-se na Urgência com crises motoras esquerdas, associadas a alteração da consciência que evoluíram para estado de mal focal. Iniciou levetiracetam e lacosamida. Punção lombar sem alterações citoquímicas e serologias víricas negativas. RM cerebral normal. Pela suspeita de encefalite autoimune, iniciou 1gr de metilprednisolona EV por 5 dias, seguido de 6 sessões de plasmaférese e depois prednisolona 60mg/d. Entretanto foi confirmado o diagnóstico pela positividade dos anticorpos anti-rNMDA no plasma e líquor. EEG seriados documentaram grave lentificação hemisférica esquerda e padrão de extreme delta brush. Do restante estudo: negatividade dos anticorpos onconeuronais e CA-125; TC toraco-abdomino-pélvica, RNM pélvica, citologia cervico-vaginal e ecografia mamária sem alterações. Pelo agravamento dos sintomas psíquicos (agitação/alucinações visuais), alterações da linguagem flutuantes, aparecimento de sinais disautonómicos (taquicardia e hipersudorese) foi iniciado rituximab 700mg/semana durante 4 semanas. Melhoria progressiva permitindo retirada gradual de antiepilépticos, corticoterapia e antipsicóticos. À data de alta a doente apresentava recuperação quase completa, mantendo ainda alguma dificuldade na escrita, leitura e cálculo. Na reavaliação em consulta aos 3 meses, a doente apresentava-se completamente recuperada, tendo retomado atividade profissional.
Na encefalite autoimune, o tratamento cardinal inclui a imunossupressão e, quando presente, a resseção tumoral. Sem tratamento pode haver deterioração neurológica e morte. É importante o reconhecimento atempado, uma vez que o tratamento precoce melhora o prognóstico, acelera a recuperação e reduz as recidivas. Défices cognitivos persistentes são mais comuns quando há atraso no tratamento. A ausência de tumor subjacente também se associa a pior prognóstico. Existe evidência que o rituximab, como segunda linha, é eficaz na redução das recidivas. Nos doentes com apresentação mais grave defende-se o seu uso como tratamento inicial em conjunto com corticoterapia e imunoglobulina EV ou plasmaférese.