Miguel Martins, Francisca Martins, Rui Malheiro, Mariana Silva
Introdução: A incidência da endocardite infeciosa (EI) tem vindo ao aumentar, à medida que a população envelhece e a proporção de doentes com dispositivos intracardíacos, nomeadamente válvulas, cresce. Torna-se assim uma doença cada vez mais frequente nas enfermarias de Medicina Interna (MI), devendo o internista estar a par das últimas atualizações e oferecer aos seus doentes os melhores cuidados possíveis numa doença com uma taxa de mortalidade ainda tão elevada.
Objetivo: Avaliar o cumprimento das recomendações de 2015 da European Society of Cardiology (ESC) para o tratamento de EI, em particular as colheitas de sangue como estratificador de risco, as alterações na antibioterapia (ATBT) e o tratamento dentário em todos os doentes.
Material e Métodos: Estudo retrospetivo conduzido num centro hospitalar central português. Colheita com recurso aos registos informáticos do doente relativos ao período. A população-alvo do estudo foram os últimos 50 doentes internados codificados no sistema hospitalar como EI, correspondente ao período ente 11/2016 e 03/2018. Características da população: 58% sexo masculino, mediana de idade 68,5 anos, 64% com múltiplas comorbilidades (4 ou mais patologias), 70% internados em enfermarias de MI, mediana de duração de internamento de 45 dias. Características da doença: 92% EI de lado esquerdo, 82% em válvulas nativas (VN), 30% por Streptococcus orais e 30% por Staphylococcus spp., manifestações extra-cardíacas em 32%, taxa de mortalidade durante o internamento atingiu os 38%, ascendendo aos 44% se contabilizada a a mortalidade até 1 ano após EI.
Resultados: Apenas 1 doente colheu hemoculturas (HCs) 48 horas a 72 horas após o início da antibioterapia (ATBT), ao passo que 10% realizam no fim do curso (não havendo recomendação para tal). Somente 24% dos doentes foram avaliados por estomatologia.
Relativamente ao uso de aminoglicosídeos e as alterações nas últimas recomendações, os resultados são discordantes consoante a bactéria isolada. No caso dos 11 doentes com infeção em VN por Staphylococcus aureus sensíveis a meticilina, um aminoglicosídeo foi usado em 45% dos casos, ao contrário do atualmente recomendado. Contudo, dos 5 doentes infetados com Streptococcus gallolyticus, nenhum realizou aminoglicosídeo, o que vai em linha com as recomendações mais recentes.
Conclusões: A mortalidade geral dos doentes com EI apresenta-se muito elevada, e apesar de ser necessário ter em contas outras características (idade do doente, comorbilidades, manifestações associadas, organismo causador), devem ser seguidas as medidas que demonstraram um impacto positivo na gestão da doença. A adequação de antibióticos, e iatrogenia causada por estes, e uma concreta estratificação da doença que nos permitam estabelecer desde cedo a prioridade cirúrgica são duas medidas a ter em conta no tratamento. Como prevenção da doença, é imprescindível uma boa higiene bucal, bem como uma reavaliação das indicações de profilaxia.