Filipa Lima, Paula Costa, Filipa Carreiro, Joaquim Amaral, Marisa Rocha, Raquel Senra, Luís Dias
Homem, 83 anos, com antecedentes pessoais de asma, demência e carcinoma da próstata, admitido no Serviço de Urgência por um quadro de edema da língua, disfagia e disartria. Associadamente, referia cefaleia temporal bilateral, com cerca de 4 meses de evolução, resistente à terapêutica instituída, nomeadamente à ergotamina, iniciada uma semana antes. À observação, constatou-se dor à palpação da região temporal e hipomotilidade da língua, que evoluiu em poucas horas para cianose e parésia (imagem A). Analiticamente, salientava-se anemia normocítica normocrómica (hemoglobina de 11,6 g/dl), velocidade de sedimentação de 62 mm/h e proteína C reativa de 23,6 mg/dl. Realizou tomografia computadorizada (TAC) de crânio que não mostrou alterações e angio-TAC que revelou diminuição da vascularização da glândula submandibular esquerda e da base da língua. O ecodoppler cervical foi compatível com inflamação arterial. Atendendo à elevada suspeição de Arterite de Células Gigantes, o doente iniciou pulsos de 1 grama de metilprednisolona com franca melhoria do quadro. Realizou biópsia da artéria temporal, no terceiro dia, após início da terapêutica, que foi negativa. A corticoterapia foi progressivamente titulada e após 3 semanas, apresentava completa resolução dos sintomas (imagem B).
A isquemia da língua com consequente necrose é uma manifestação rara, mas grave, de Arterite de Células Gigantes. O seu surgimento implica o atingimento da artéria lingual e dos inúmeros colaterais que vascularizam a língua. A ergotamina, ao induzir vasoespasmo, pode desencadear a isquemia, situação descrita em inúmeros casos na literatura. Embora a biópsia da artéria temporal permita confirmar o diagnóstico, a sua sensibilidade varia entre 15 a 40%, sendo por isso a presença dos restantes critérios clínicos e laboratoriais fundamental para o diagnóstico. O inicio precoce da corticoterapia é essencial, reduzindo a mortalidade e complicações resultantes da necrose da língua.