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PARAMILOIDOSE ADQUIRIDA: UM EPISÓDIO DE SÍNCOPE
Doenças cérebro-vasculares e neurológicas - Caso Clínico
Congresso ID: CC100 - Resumo ID: 605
Centro Hospitalar Lisboa Ocidental - Hospital São Francisco Xavier, Serviço de Medicina III
Catarina Mateus, Maria João Correia, Rui Morais, Andreia Curto, Dinis Mateus, Manuel Araújo, Cândida Fonseca, Luís Campos
Introdução: No serviço de urgência (SU) é frequente surgirem casos de síncope. O diagnóstico diferencial neste contexto nem sempre é fácil. Os autores apresentam um caso frequente de síncope, mas de etiologia rara.

Caso Clínico: Homem, 62 anos, recorre ao SU por episódios de síncope de repetição, após alteração de posição de decúbito para ortostatismo, precedidos de perturbação visual. Referia diminuição da sensibilidade nos membros inferiores (MI) de agravamento progressivo, com necessidade de apoio na marcha; diarreia frequente, e perda ponderal de 10 kg no último ano. O doente tinha história conhecida de diabetes mellitus tipo 2, doença hepática crónica etanólica, submetido 10 anos antes a transplante hepático sequencial: recebeu fígado com mutação da proteína transtirretina (polineuropatia amiloidótica familiar-PAF); 9 anos depois inicia quadro de episódios de taquicardia supra-ventricular paroxística (TSVP) com necessidade de cardioversão química. À observação apresentava marcha steppage, desidratação, TA 108/60mmHg com variação superior a 20mmHg após mudança de posição; FC 64bpm, ritmo sinusal. Analiticamente sem alterações de relevo. Realizou ECG, radiografia de tórax, TC CE sem alterações agudas. ECG de Holter revelou episódios curtos de TSVP. Tinha realizado biópsia de glândula salivar que revelou deposição de amilóide e EMG compatível com polineuropatia grave sensitivo-motora dos membros superiores (MS). Realizou RMN cardíaca, que não demonstrou sinais sugestivos envolvimento cardíaco por deposição de amilóide. Admitimos tratar-se de polineuropatia amiloidótica adquirida após transplante hepático com fígado PAF, que desenvolveu polineuropatia periférica: MS, MI e disautonomia (diarreia, gastroparésia, TSVP, hipotensão ortostática e síncope). Uma vez que se tratava de doença avançada, sem indicação para retransplante, nem terapêutica farmacológica dirigida à PAF, foi apenas realizada otimização de terapêutica sintomática. Sem recidiva até à data dos episódios de síncope.

Discussão: A PAF é endémica em Portugal, com penetrância variável, incapacitante e geralmente fatal. Dada a escassez de órgãos para transplantação foi iniciado na década de 90 o transplante hepático sequencial, onde doentes selecionados, que de outra forma não chegariam a receber um órgão, recebem fígado PAF. Este fígado PAF continuará a formar substância amilóide, que se irá depositar progressivamente no tecido nervoso periférico, tecido de condução cardíaco, etc. Seria expectável que doentes transplantados com fígado PAF só viessem a desenvolver clínica tardiamente ou nunca, não interferindo com a sua qualidade/esperança de vida. Os dados de vida real e experiência têm vindo a mostrar que a clínica pode surgir bem mais cedo que o expectável como aconteceu com este doente transplantado em idade jovem. A síncope poderia neste caso ser de etiologia disautonómica apenas e/ou por envolvimento do sistema de condução cardíaco e bloqueio de alto grau, que não evidenciámos.