Ana Filipa Cardoso, Gabriela Pereira, Margarida Rocha, Ussumane Embaló, Jorge Cotter
INTRODUÇÃO: A cardiomiopatia de Takotsubo (CT) está frequentemente associada a um stress físico ou emocional e é caracterizada por uma disfunção transitória do ventrículo esquerdo que geralmente cursa com alterações na cinética do ápex. O diagnóstico deve ser equacionado quando a distribuição das alterações da cinética segmentar não respeita o território de uma única artéria coronária. Numa fase sub-aguda, o ECG é geralmente caracterizado por alterações evolutivas típicas, nomeadamente a inversão difusa das ondas T e o prolongamento do intervalo QT.
DESCRIÇÃO: Apresentamos o caso clínico de uma mulher de 59 anos com antecedentes de tabagismo ativo (10 UMA), síndrome depressivo e doença pulmonar obstrutiva crónica (DPOC). Foi levada ao serviço de urgência após ter sido encontrada caída, desorientada e sem memória para o sucedido. Referência a agravamento do padrão habitual de tosse e expetoração nos dias prévios. Sem outra sintomatologia acompanhante, nomeadamente toracalgia. Na admissão apresentava-se taquipneica, com utilização dos músculos acessórios da respiração, saturações periféricas de 76% com oxigenioterapia suplementar a 40% e sibilância exuberante e dispersa. Gasimetria arterial (fiO2 40%) com insuficiência respiratória (IR) hipercápnica grave (pH 7.1, pO2 57 mmHg, pCO2 128 mmHg, lact 1.5). Analiticamente a destacar leucocitose marcada e aumento da troponina T (1.7 ng/mL; N<0.045). ECG revelou taquicardia sinusal com supradesnivelamento de ST <1mm em V4-V5 e inversão da onda T de V3-V6. O ecocardiograma mostrou uma fração de ejeção ventricular esquerda (FEVE) ligeiramente deprimida e hipocinésia médio-distal de todas as paredes com hipercontractilidade dos segmentos basais. Foi assumida uma provável CT no contexto de DPOC agudizada com insuficiência respiratória e manteve-se sob vigilância clínica e elétrica apertadas. Iniciou ventilação não-invasiva e cumpriu antibioterapia com evolução favorável. Os biomarcadores mantiveram um perfil descendente e o ECG evoluiu com ondas T negativas em todas as derivações e prolongamento do intervalo QT. Ecocardiograma de reavaliação com melhoria da cinética segmentar e normalização da FEVE, favorecendo o diagnóstico de CT. Teve alta com indicação de reavaliação imagiológica e eletrocardiográfica em duas semanas.
CONCLUSÃO: A CT é um diagnóstico a ser considerado nos doentes admitidos por DPOC agudizada que apresentam alterações nos marcadores cardíacos, no eletrocardiograma e/ou dor torácica. Apesar de ser geralmente considerada uma doença benigna, a mortalidade intra-hospitalar é semelhante à das síndromes coronárias agudas, pelo que o reconhecimento precoce desta entidade é fundamental pelas potenciais implicações terapêuticas e de orientação que poderão existir. Este caso pretende relembrar que a DPOC agudizada e a IR aguda, entidades frequentemente encontradas na prática clínica, são potenciais indutores de CT.