RUI FLORES, RITA MATOS, MARIA TEIXEIRA, MICKAEL HENRIQUES, JOANA LOPES, MAURÍCIO PEIXOTO, SOFIA CARIDADE
Introdução: A doença renal crónica é uma entidade frequente associada a alta morbimortalidade e com impacto no turnover ósseo. A patofisiologia é complexa e envolve a interação entre o rim, glândulas paratiroides, osso, intestino e vasos. O termo histológico “osteodistrofia renal” é utilizado para alterações da morfologia óssea secundárias a doença renal crónica. Variantes de osteíte fibrosa quística, incluindo o tumor castanho, são atualmente raras em países desenvolvidos.
Caso clínico: Sexo feminino, 70 anos, nacionalidade portuguesa mas trabalhadora emigrante na Austrália. Regressou recentemente a Portugal. Sem registos médicos. Antecedentes de artrite reumatoide, hipertensão e “lesão renal recente por toxicidade a fármacos”. Medicada com furosemida 160 mg/dia. Recorre ao SU por queixas de dor e edema do punho direito após queda acidental. TC excluiu fratura. Alta medicada com prednisolona 10 mg/dia e AINE. Encaminhada para consulta de Medicina Interna para seguimento. Apuradas queixas de artralgias generalizadas com limitação funcional e quedas acidentais frequentes, noção subjetiva de baixo débito urinário e edema generalizado. Tem TC-TAP recente, que mostrava “(...) Área suspeita mal definida no ilíaco direito (...)”. Encaminhada para o SU. Analiticamente, apresentava disfunção renal (pCr 4,3 mg/dL), anemia normocítica normocrómica (Hb 9,9 g/dL) e elevação da fosfatase alcalina (248 U/L). Repetiu TC, que mostrou “(...) Volumosa hérnia de hiato esofágico com espessamento parietal do segmento herniado (...). Lesão lítica na asa ilíaca direita com 25 mm (...)”. Internamento para estudo de disfunção renal, lesões líticas e anemia. Do estudo realizado, PTH 1848 pg/mL, vitamina D 15 ng/mL e ecografia com atrofia renal bilateral e perda da diferenciação corticomedular. Metabolismo fosfocálcio, eletroforese de proteínas e imunoglobulinas sem alterações. Optou-se por biópsia óssea ecoguiada de lesão do ilíaco. Restante pesquisa de neoplasias sólidas negativa. Resultado histológico com achados compatíveis com tumor castanho do hiperparatiroidismo. Ecografia cervical excluiu massas paratiroideias. Assumido hiperparatiroidismo secundário a doença renal crónica complicado com lesões do esqueleto axial.
Discussão: Uma das manifestações clássicas do hiperparatiroidismo secundário inclui a osteíte fibrosa quística. Os tumores castanhos resultam de atividade osteoclástica excessiva e representam lesões expansivas benignas não neoplásicas. O envolvimento do esqueleto axial é raro. O diagnóstico implica biópsia óssea e o tratamento é dirigido ao metabolismo fosfocálcio. Apresentamos o caso de uma doente em que, uma vez excluído mieloma múltiplo, se ponderou uma neoplasia sólida oculta. A biópsia dirigida às lesões permitiu concluir quanto ao diagnóstico, enquadrado no antecedente de doença renal crónica. Apesar de menos provável, o diagnóstico diferencial de doenças benignas para lesões osteolíticas deve ser sempre equacionado.