(1) Oncologia Médica - IPO do Porto; (2) Medicina Interna, (3) Cardiologia, (4) Infecciologia, (5) Oftalmologia - Hospital Pedro Hispano
Marta Pina (1), Raquel Santos (2), Gracieta Malangatana (3), Frederico Duarte (4), Pedro Coelho (5), Ana Veloso (2), J. Vasco Barreto (2), Mariana Taveira (2)
INTRODUÇÃO:
A endocardite infeciosa é uma doença relativamente rara apresentando elevada morbi-mortalidade se não diagnosticada e tratada. Os principais fatores de risco são a existência de patologia cardíaca estrutural, dispositivos intravasculares, imunossupressão e utilização de drogas endovenosas. Os agentes microbianos mais comuns são Staphylococcus e Streptococcus. O espectro de apresentação clínica é amplo, por isso, a suspeita diagnóstica deve ser elevada de forma a diligenciar um estudo complementar adequado proporcionando diagnóstico e tratamento célere.
CASO CLÍNICO:
Homem de 44 anos, monitor em ginásio, utilizador de substâncias anabolizantes intramusculares (IM) para hipertrofia muscular. Tem antecedentes de cardiopatia dilatada e doença renal crónica (Creatinina basal 1.3mg/dL). Recorre ao serviço de urgência por vertigem e visão turva com horas de evolução a que se soma quadro de febre, shivering, artralgias, dor abdominal e astenia com 1 mês de evolução. Ao exame físico identificado sopro holossistólico II/VI pré-cordial, hepatoesplenomegalia e alterações compatíveis com lesões de Janeway e nódulos de Osler. Analiticamente com anemia (Hb 12g/dL), leucocitose (14510u/L com 91% neutrófilos), proteína C reativa e velocidade de sedimentação elevadas (110mg/L e 74mm/1h respetivamente) e creatinina 3.1mg/dL. Estudo tomográfico abdominal documentou alterações sugestivas de embolização hepática e esplénica. Também na tomografia cerebral surgem lesões aparentemente embólicas com pequenas áreas hemorrágicas. Colocada a hipótese de endocardite infeciosa complicada com embolização multiorgânica, com provável ponto de partida em procedimentos injetáveis. Diagnóstico confirmado por ecocardiograma transtorácico e transesofágico que mostraram vegetações da válvula mitral a condicionar insuficiência mitral severa. Avaliado por oftalmologia que verificou a presença de manchas retinianas de Roth. Estudo microbiológico com isolamento, em múltiplas hemoculturas, de Staphylococcus aureus meticilino-sensível. Pela gravidade clínica e risco de embolização adicional foi submetido a substituição valvular urgente após 1 semana de antibioterapia. Ao longo tratamento cumpriu 6 semanas de antibioterapia após cirurgia verificando-se melhoria clínica e analítica paulatinas. Avaliado em consulta externa onde se manteve assintomático, apirético, sem evidência de inflamação sistémica e com regressão dos achados tomográficos
CONCLUSÃO:
O presente caso clínico, com uma apresentação clínica rica e profusamente ilustrado, permite rever um caso de endocardite infeciosa com insuficiência valvular grave complicada com múltiplos fenómenos imunológicos e embólicos num contexto epidemiológico incomum de injeção IM de suplementos hormonais com intuito hipertrófico. Salienta-se, ainda, a necessidade de um estudo detalhado do contexto epidemiológico destes doentes, de um exame físico criterioso e de uma atuação clínica multidisciplinar.