Inês Egídio, Teresa Neves, Carolina Gouveia, Inês Ferreira, Sofia Duque, Luís Campos
Introdução: A disfagia apresenta elevada prevalência na população idosa, sendo uma entidade frequente na prática clínica, afetando cerca de 30% dos idosos internados.Apresenta-se um caso de disfagia de etiologia pouco comum numa Unidade de Ortogeriatria.
Caso clínico: Homem de 91 anos, previamente autónomo, com função cognitiva preservada, hipertensão arterial controlada com enalapril e adenocarcinoma do colón operado. Recorreu ao serviço de urgência após queda no domicílio de que resultou traumatismo craniano e do membro inferior esquerdo, com dor e impotência funcional do membro. Realizou radiografia que mostrou fratura dos planaltos tibiais à esquerda, tomografia computorizada (TC) de crânio sem lesões agudas e análises sem alterações, ficando internado no serviço de Ortopedia.Submetido a osteossíntese da tíbia sob anestesia geral sem intercorrências. No pós-operatório apresenta disfagia, sialorreia, odinofagia e disfonia. Testado GUSS com disfagia para sólidos e líquidos. Foi avaliado por terapeuta da fala que constatou ausência de reflexo de mordida, sucção, vómito e palatal. Pelo risco de aspiração foi colocada sonda nasogástrica (SNG) para alimentação. Dadas características de disfagia orofaríngea e ausência de alterações na TC de crânio, admitido quadro secundário a entubação orotraqueal.A observação por otorrinolaringologia (ORL) revelou alteração da fase de transporte faríngea, de sensibilidade e mobilidade laríngea, imobilidade do hemipalato esquerdo, desvio da língua para a esquerda e paralisia da corda vocal esquerda, traduzindo paralisia do nervo glossofaríngeo, vago ou hipoglosso à esquerda. A ressonância magnética (RM) de crânio não revelou alterações; TC cervical e torácica revelou massa mediastínica em localização pré-aórtica, posterior ao manúbrio esternal, estendendo-se até ao opérculo torácico, de limites bem definidos, densidade líquida, condicionando estiramento do tronco braquiocefálico venoso.Admitiu-se massa do mediastino anterior com compromisso do nervo vago e/ou do recorrente a condicionar a disfagia, de etiologia a esclarecer.Realizou RM para caracterização da massa que revelou lesão de limites bem definidos: hematoma, linfocelo ou linfangioma, não se podendo excluir doença linfoproliferativa ou timoma.O doente teve alta com SNG com indicação para reavaliação imagiológica e vigilância em ORL, medicina física e reabilitação de deglutição. A reavaliação com TC confirmou lesão benigna de características quísticas, compatível com linfocelo pós-traumático ou linfangioma quístico.
Discussão: Apesar das alterações fisiológicas da deglutição poderem estar associadas ao envelhecimento, a ocorrência de disfagia no idoso pode constituir uma manifestação de diversas patologias, algumas tratáveis e que devem excluídas. A elevada prevalência de quedas do idoso deve alertar quer para a necessidade de prevenção quer para a possibilidade de manifestação de entidades clínicas pós traumáticas que podem não ser comuns nem evidentes.