João Alexandre Tavares, Mário Parreira, Ana Emídeo, Patrícia Carneiro, Carolina Palma, Ricardo Pereira, Ermelinda Pedroso
Homem de 39 anos com antecedentes de hipertensão arterial não controlada, obesidade e tabagismo. Recorre ao serviço de urgência do por quadro súbito de náuseas, vómitos e cefaleia intensa, com instalação progressiva de diminuição da força muscular no hemicorpo esquerdo. À admissão com hemiparesia esquerda de grau 2/5 e perfil tensional hipertensivo (230/130 mmHg). TC-CE revelou volumoso hematoma lobar direito agudo com edema perilesional, rutura para o sistema ventricular com significativo efeito de massa, apagamento sulcal difuso do hemisférico direito e desvio da linha média para a esquerda de 8 mm. Apresentava ainda apagamento da cisterna supra-selar, báscula do mesencéfalo e herniação subfalcial anterior. Transferido para Hospital Garcia de Orta (HGO) ao cuidado da Neurocirurgia (NC), tendo realizado drenagem de hematoma, com posterior extubação e transferência para a Unidade de Cuidados Intensivos. Inicialmente com evolução neurológica desfavorável e necessidade de re-intubação para proteção da via aérea. Evolução neurológica lenta, acompanhada de agitação, com necessidade de traqueostomia. Hemiplégia esquerda que, sob reabilitação intensiva apresentou melhoria progressiva, permitindo encerramento da traqueostomia e referenciação para Centro de Reabilitação de Alcoitão. Regressou ao CHS após cerca de 2 meses.
A hemorragia intracerebral espontânea (HIC) representa cerca de 10-15% do total de acidentes vasculares cerebrais, apresentando um prognóstico vital mais sombrio, com uma mortalidade a 30 dias de 35-52%, independente da sua etiologia primária. A rápida identificação, estabilização e orientação destes doentes à luz das recomendações mais recentes é fundamental e tem grande impacto no prognóstico. Este facto é ainda mais verdade em hospitais sem apoio de NC, em que a otimização das medidas médicas é fundamental e os atrasos na transferência destes doentes, muitas vezes por razões não clínicas, pode ser desastrosa. Assim, torna-se essencial a existência de protocolos de atuação clínica rápida e facilmente aplicáveis. Estes devem incluir não apenas a estabilização segundo ABCDE, com a proteção da via aérea à cabeça, mas também as medidas médicas e não médicas de controlo do perfil tensional, reversão da anticoagulação e controlo da pressão intracraniana ou ainda a profilaxia da convulsão e a redução do risco de aspiração. Finalmente é fundamental assegurar a rápida articulação com o hospital de referência com NC, bem como a transferência do doente para tratamento definitivo em caso de indicação e/ou instituição de medidas invasivas de monitorização. Assim, em colaboração com um serviço de NC, estabeleceu-se um protocolo de atuação adequado à realidade clínica dos hospitais sem NC.